Opus — Seleção de Sundance Midnight
- Fernando Gomes
- 9 de fev.
- 4 min de leitura

Um dos maiores privilégios de assistir a esses filmes antes de todo mundo é poder ter uma interpretação e um review livres da influência de outros críticos ou do público. Opus é o novo filme de terror da A24, o que, por si só, já é suficiente para gerar interesse e apreço imediato. Esse também é o tipo de longa-metragem que inevitavelmente virá acompanhado de um monte de gente me dizendo que é genial e que eu não entendi — afinal, é mais um terror elevado, inteligente demais para o espectador médio.
Opus acompanha um cantor e músico extremamente famoso e influente, cujos períodos de desaparecimento só são sobrepostos pelo sucesso imensurável que acompanha seus projetos após essas ausências. Em determinado momento, esse hiato se torna tão grande — quase trinta anos, para ser específico — que grande parte dos fãs, dos tabloides e do mundo está quase certo de que ele está morto.
Imagine a surpresa da indústria quando, então, Alfred Moretti anuncia seu novo álbum de forma inesperada. Elevado a proporções globais, o hype e o interesse por essa nova obra são instantâneos. Compreensível, já que, em Opus, Moretti é uma espécie de figura lendária da música, com sucessos que superam tudo e todos que já existiram. Adaptando-se às práticas da era digital, Moretti decide realizar uma listening party exclusiva em sua residência hiperisolada para um grupo ultrasseleto de pessoas — incluindo Ariel Ecton (Ayo Edebiri), uma ambiciosa jornalista novata.
Em uma primeira hora excruciante, que nunca escolhe em qual de suas inúmeras ideias interessantes focar, Opus acompanha esse grupo fazendo de tudo para agradar Moretti. “SYCOPHANTS”, anota Ariel Ecton em seu caderno, nos indicando a característica que define esse grupo: bajuladores. De forma gradativa, vamos nos aprofundando no álbum, na experiência auditiva e nos eventos atípicos que cercam a mansão.
Funcionários com olhos vazios, desaparecimentos randômicos, abertura de ostras em busca de pérolas e diversas outras atividades que nunca chegam a lugar nenhum tentam emular o clima de “algo está errado nesse paraíso idílico”. Uma fórmula que encontrou sucesso em filmes como Midsommar, Corra!, O Menu e, mais recentemente, Pisque Duas Vezes — tanto por direções competentes quanto por substância, algo que falta em Opus.
Parece quase irônico — e, de certa forma, poético — que um filme sobre o quão insípidas e inanes são essas celebridades que adquirem louvor incondicional venha da A24. Uma distribuidora que parece ter se tornado uma entidade por si só e que acumulou uma legião de fãs dispostos a aceitar e aclamar qualquer coisa que carregue seu selo. Muito similar ao tipo de sucesso e bajulação que o próprio Moretti recebe aqui.
Em certo momento, o filme faz um comentário interessante sobre como nós, enquanto sociedade, nos tornamos mais indulgentes, complacentes e permissivos de acordo com o nível de genialidade e sucesso de uma pessoa. Um fato deplorável, mas real, sobre como o culto às celebridades dispensa filtro e como a influência dessas pessoas se estende vastamente além dos seus campos de genialidade.
Porém, Opus nunca se preocupa em ir além da superfície aqui — ou em qualquer outro de seus temas de bajulação, exploração, atenção como commodity e a deturpação da hierarquia social. Os méritos de Opus são poucos, como nunca colocar a música em primeiro plano, algo que reflete o quão desnecessária a arte se torna para o sucesso e a influência após certo grau de fama. Além disso, Ayo Edebiri é uma das únicas final girls que realmente parece tomar todas as decisões corretas.
Dito isso, o elenco, em sua totalidade, é desperdiçado em personagens sem carisma, nuance ou complexidade. A atuação convincente de John Malkovich não é suficiente para esconder a pobreza de seu personagem — um ególatra cujas motivações alternam entre individualismo absoluto e o sonho de criar um mundo melhor. Algo que recai no real, já que todo ególatra acredita ser o único com as respostas para tudo o que há de errado no mundo, mas que aqui não tem a fundação necessária para ser efetivo.
As motivações de Moretti são, no mínimo, inexploradas e, no máximo, exprimidas por uma anedota sobre o sequestro de Júlio César. Uma história sobre como o imperador foi feito refém por piratas e negociado pelo preço de um cidadão comum em primeira instância, apenas para sugerir que os piratas pedissem 150% do valor normal. A negociação ocorre e termina com o imperador livre, crucificando todos os piratas. De acordo com Moretti, o problema e a morte dos piratas aconteceram porque eles acreditaram que Júlio César era igual a todos os outros — motivação que ele toma para si porque, em algum momento de sua longa carreira, jornalistas e figuras da indústria o criticaram.
Esse é o tipo de filme que implora para que você o ache inteligente e que te convida o tempo todo a encontrar essa erudição temática. Esse comentário social iluminado em forma de cinema. Essa riqueza de debate e reflexão essencial para a sociedade. No fim, assim como Moretti, Opus se apoia no nome da distribuidora, no elenco de peso e na crença da audiência de que é bom para parecer maior do que realmente é.
Sem os filtros da adulação, fica bem claro que é pobre em conteúdo, forma e originalidade. Tentando se sustentar no sucesso passado de seus atores, do gênero e da distribuidora para parecer relevante, quando, na verdade, é apenas mais um filme para o qual direcionaram atenção, mas que não tem nada a dizer.
Comments